Entre impostos, privilégios e derrotas: quando o povo paga o preço da política por alguém que ainda acredita na democracia, mas desconfia dos seus donos
Ao
acompanhar as notícias sobre a votação no Congresso, senti um misto de
vergonha, frustração e uma velha conhecida: a sensação de que, mais uma vez, o
povo foi empurrado para o fim da fila.
A
proposta do Governo Federal era clara e justa: isentar do Imposto de Renda
as pessoas que ganham até cinco mil reais mensais — uma faixa onde estão
milhões de brasileiros sufocados por boletos, inflação, aluguel e um custo de
vida que já não cabe no salário. Em contrapartida, haveria aumento na
alíquota do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), algo que, embora
discutível, ao menos apontava para uma lógica distributiva: tirar um pouco
mais das transações financeiras para aliviar o bolso de quem vive do trabalho.
Mas o
Congresso disse não. Mais do que isso: humilhou a proposta, engavetou a
isenção e rejeitou o reajuste do IOF. E, no mesmo movimento, aprovou uma PEC
para aumentar o número de parlamentares — como se já não tivéssemos um
Legislativo caro, lento e muitas vezes insensível à realidade do país.
Quando o poder se protege de si
mesmo
Fiquei me
perguntando: como explicar essa escolha?
Como justificar que, em meio a uma crise social grave, em vez de aliviar a
carga de quem ganha pouco, o Congresso opte por se expandir — como se fosse um
organismo inchado que se alimenta de si mesmo?
Sei que
nem tudo é simples, que a política exige acordos e cálculos. Mas há limites.
E o limite, neste caso, foi ultrapassado com cinismo.
O aumento
de parlamentares é vendido como "ampliação da representatividade".
Mas a quem enganam? O que vimos foi um pacto silencioso entre setores da
direita, do centrão e até alguns da esquerda institucionalizada, para manter
privilégios, cargos e fatias do orçamento.
Enquanto
isso, o brasileiro que ganha R$ 4.800 — que já deveria ser isento — continua
sendo taxado como se fosse classe média alta. É injusto. É desumano.
É a política esquecendo quem a elege.
Um sistema tributário que castiga
a base e poupa o topo
O Brasil
tem um dos sistemas tributários mais regressivos do mundo.
Pobre paga proporcionalmente muito mais imposto do que rico. Quem vive de
dividendos e renda do capital muitas vezes paga menos que um professor ou
enfermeira.
A isenção
até cinco mil reais era uma chance concreta de corrigir um pouco essa
distorção.
Não era revolução. Era justiça fiscal básica. E ainda assim foi recusada.
Dói ver
um Congresso que diz não ao alívio para milhões, mas diz sim a mais
cadeiras, mais verbas, mais estrutura para si.
A democracia em risco — de si
mesma
Fico me
perguntando até onde vai essa desconexão. A cada movimento como esse, a
descrença cresce. Não é por acaso que tantos brasileiros se sentem órfãos
de representação, que cresce o discurso antipolítica, e que setores
autoritários se aproveitam disso para atacar a própria democracia.
Mas o
problema não é a democracia — é o que estão fazendo com ela.
O que fazer?
Como
cidadão, como alguém que ainda se importa, me recuso a aceitar isso como
normal.
Precisamos:
- Pressionar por uma reforma
tributária mais justa, que tribute lucros e dividendos e alivie o
trabalhador;
- Fiscalizar os parlamentares, nome por nome, voto por
voto — e lembrar disso nas urnas;
- Fortalecer os movimentos
sociais e populares, que são os únicos que ainda colocam o povo
em primeiro lugar;
- Debater nas escolas, nas
redes, nas ruas —
para que a política não seja sequestrada por interesses de casta.
Conclusão:
ou mudamos o jogo, ou seremos sempre a conta a pagar
A derrota
do Governo Federal nesta pauta não é apenas um revés legislativo.
É o retrato de um país onde a vontade popular segue sendo atropelada pela
manutenção de privilégios.
Mas a
política não é dos políticos.
A política é nossa.
E se não
fizermos dela um instrumento de justiça,
ela continuará sendo a máquina que nos esmaga em nome do próprio conforto.
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